quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

A educação durante a ditadura militar

Artigo de Braulio Wanderley


Alguma coisa acontecia na educação brasileira. Pensava-se em erradicar definitivamente o analfabetismo através de um programa nacional, levando-se em conta as diferenças sociais, econômicas e culturais de cada região.
A criação da Universidade de Brasília, em 1961, permitiu vislumbrar uma nova proposta universitária, com o planejamento, inclusive, do fim do exame vestibular, valendo, para o ingresso na Universidade, o rendimento do aluno durante o curso de 2º grau (ex-Colegial e atual Ensino Médio).

O período anterior, de 1946 ao princípio do ano de 1964, talvez tenha sido o mais fértil da história da educação brasileira. Neste período atuaram educadores que deixaram seus nomes na história da educação por suas realizações. Neste período atuaram educadores do porte de Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo, Lourenço Filho, Carneiro Leão, Armando Hildebrand, Pachoal Leme, Paulo Freire, Lauro de Oliveira Lima, Durmeval Trigueiro, entre outros.
Depois do golpe militar de 1964 muito educadores passaram a ser perseguidos em função de posicionamentos ideológicos. Muito foram calados para sempre, alguns outros se exilaram, outros se recolheram à vida privada e outros, demitidos, trocaram de função.
O Regime Militar espelhou na educação o caráter anti-democrático de sua proposta ideológica de governo: professores foram presos e demitidos; universidades foram invadidas; estudantes foram presos, feridos e alguns foram mortos, nos confronto com a polícia, através dos aparelhos repressivos como o DOPS, o DOI-CODI; os estudantes foram calados, a UBES (União Brasileira de Estudantes Secundaristas) e a UNE (União Nacional dos Estudantes) proibidas de funcionar; o Decreto-Lei 477 calou a boca de alunos e professores; o Ministro da Justiça declarou que "estudantes tem que estudar" e "não podem fazer baderna". Esta era a prática do Regime. Diante da via pacifica adotada pelo PCB após o XX Congresso do PCUS e a busca de conciliação entre o bloco soviético e o bloco estadunidense após as denuncias de Krushev, muitos aderiram à luta armada nas organizações clandestinas como o PC do B (Partido Comunista do Brasil), ALN (Aliança Libertadora Nacional), VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), POLOP (Comando Revolucionário Marxista-Leninista de Política Operária), PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário).
Contraditoriamente, neste período deu-se a grande expansão das universidades no Brasil. E, para acabar com os "excedentes" (aqueles que tiravam notas suficientes, mas não conseguiam vaga para estudar), foi criado o vestibular classificatório. Para erradicar o analfabetismo foi criado o Movimento Brasileiro de Alfabetização - MOBRAL. Aproveitando-se, em sua didática, no expurgado Método Paulo Freire, o MOBRAL propunha erradicar o analfabetismo no Brasil... não conseguiu. E entre denúncias de corrupção... foi extinto.
É no período mais cruel da ditadura militar, onde qualquer expressão popular contrária aos interesses do governo era abafada, muitas vezes pela violência física, que é instituída a Lei 4.024, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1971. A característica mais marcante desta Lei era tentar dar a formação educacional um cunho profissionalizante. Dentro do espírito dos "slogans" propostos pelo governo, como "Brasil grande", "ame-o ou deixe-o", "milagre econômico", etc., planejava-se fazer com que a educação contribuísse, de forma decisiva, para o aumento da produção brasileira.
A ditadura militar se desfez por suas contradições: fim do famigerado milagre brasileiro; aumento da inflação e da dívida externa; arrocho salarial; reorganização do movimento operário com as greves do ABC paulista; a luta pela anistia ampla e geral; a revogação do AI-5 e o movimento diretas já!. Tamanha era a pressão popular, de vários setores da sociedade, que o processo de abertura política tornou-se inevitável. Mesmo assim, os militares deixaram o governo através de uma eleição indireta, mesmo que concorressem somente dois civis (Paulo Maluf-PDS e Tancredo Neves-PMDB).

No fim, a reação conseguiu o que quis, fez uma transição sem julgar os crimes cometidos pelo Estado e sucateando os setores essenciais ao povo e à classe operária do Brasil. O processo de terceirização de direitos e garantias começou com o aumento de alunos da classe média na escola privada, passou pelos planos de saúde, pela segurança privada (das grades, portões às empresas e ao “guarda do apito”). Constituiu-se um Estado burguês tributarista e concentrador de renda, corrupto na essência e alienante no seu aparelho ideológico, a mídia, na medida em que os próprios movimentos populares caíram no aparelhismo e na burocracia da democracia burguesa e institucional.