segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Essa é muito boa....


A poesia que a renova a vida...

Minha amiga Bet, como sempre, atenta e sensível ao inesperado... manda-me, toda semana, poesias e mais poesias na tentativa, quem sabe, de tornar a vida mais bela e acreditar que nem só de política, economia e tragédia vivem as pessoas. E que bom que é assim...

Para não deixar o lirismo cair no esquecimento, Bet me manda esta obra prima de Vinicius que tinha a "mulher" e o "amor" como fontes renováveis de inspiração... assim é a poesia que segue abaixo...

O HAVER - Vinicius de Moraes

Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
- Perdoai! eles não têm culpa de ter nascido...

Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo que existe.

Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer balbuciar o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir na madrugada passos que se perdem sem memória.

Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera cega em face da injustiça e do mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de sua inútil poesia e de sua força inútil.

Resta esse sentimento da infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa tola capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem de comprometer-se sem necessidade.

Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será e virá a ser
E ao mesmo tempo esse desejo de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não têm ontem nem hoje.

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante.
E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta essa obstinação em não fugir do labirinto
Na busca desesperada de uma porta quem sabe inexistente
E essa coragem indizível diante do grande medo
E ao mesmo tempo esse terrível medo de renascer dentro da treva.

Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem história
Resta essa pobreza intrínseca, esse orgulho, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.

Resta essa fidelidade à mulher e ao seu tormento
Esse abandono sem remissão à sua voragem insaciável
Resta esse eterno morrer na cruz de seus braços
E esse eterno ressuscitar para ser recrucificado.

Resta esse diálogo cotidiano com a morte, esse fascínio
Pelo momento a vir, quando, emocionada
Ela virá me abrir a porta como uma velha amante
Sem saber que é a minha mais nova namorada.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

A TV das ilusões: uma janela para o nada

Em pleno ano eleitoral, aumento de impostos (com efeito cascata), impunidade nas polícias, na política e na justiça, explosão de propagandas de drogas lícitas como cerveja e cachaça e para desviar a possibilidade e a capacidade do telespectador em refletir sobre o que realmente acontece neste país globalizado e alienado tem o 8º exemplar do Big Brother Brasil nos lares brasileiros.

Tanto é assim que a mídia se rende aos “encantos inovadores” dos participantes e reproduz de forma avassaladora os pormenores da tão famosa casa como se isso fosse a pauta da vez. A tirar pelas páginas principais dos jornais e revistas, bem como sites que são referências em notícias, fazem bom uso da audiência um box especial para os apreciadores de coisas pasteurizadas.

O fenômeno comunicacional, que vem sendo realimentado há quase 10 anos, pode ser um indicador do cansaço da audiência em perceber apenas notícias rotineiras dos telejornais que mudam apenas de canal e roupa mas o conteúdo é semelhante. Outro fator que contribui com este cenário pode ser as poucas opções de canais e programações, deixando o telespectador com o comodismo de aceitar qualquer coisa para assistir já que qualquer outra saída vai chegar no mesmo lugar: nada.

Assim caminha a nossa televisão considerando o alcance da maior emissora do país (Rede Globo), e compreendendo que quase nada tem sido feito no sentido de reverter este quadro. Radicalismo à parte, a TV, hoje, é praticamente uma janela aberta para o nada. E assim sendo, que função podemos delegar a grande mídia que não seja de alienação e desequilíbrio do processo de renovação social? Que sociedade estamos formando onde nos bancos universitários, nos bares e nas baladas, jovens e adultos têm o mesmo discurso: o que acontece na famosa casa do BBB.

A construção imagética do programa BBB pode ser o resultado de uma sociedade que já vem assimilando conteúdos nada edificantes e questionadores e portanto, pouco tem a dizer, indagar e refletir sobre a possibilidade de novos conhecimentos e avanços dessa sociedade.

Dessa forma, a mídia consolida e estimula este processo degradante na medida em que pouco ou nada faz para reverter este cenário. E fazendo questionamentos apenas nos centros acadêmicos criamos uma rotina do discurso embolado, isto é, apenas para o mesmo grupo, os mesmos pares, as mesmas “cabeças”.

A TV das ilusões entrou na UTI. Algo tem que ser feito com urgência no sentido de modificar o quadro clínico antes que a causa morte seja a inércia de uma sociedade em transformar esta mesma sociedade.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

A educação durante a ditadura militar

Artigo de Braulio Wanderley


Alguma coisa acontecia na educação brasileira. Pensava-se em erradicar definitivamente o analfabetismo através de um programa nacional, levando-se em conta as diferenças sociais, econômicas e culturais de cada região.
A criação da Universidade de Brasília, em 1961, permitiu vislumbrar uma nova proposta universitária, com o planejamento, inclusive, do fim do exame vestibular, valendo, para o ingresso na Universidade, o rendimento do aluno durante o curso de 2º grau (ex-Colegial e atual Ensino Médio).

O período anterior, de 1946 ao princípio do ano de 1964, talvez tenha sido o mais fértil da história da educação brasileira. Neste período atuaram educadores que deixaram seus nomes na história da educação por suas realizações. Neste período atuaram educadores do porte de Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo, Lourenço Filho, Carneiro Leão, Armando Hildebrand, Pachoal Leme, Paulo Freire, Lauro de Oliveira Lima, Durmeval Trigueiro, entre outros.
Depois do golpe militar de 1964 muito educadores passaram a ser perseguidos em função de posicionamentos ideológicos. Muito foram calados para sempre, alguns outros se exilaram, outros se recolheram à vida privada e outros, demitidos, trocaram de função.
O Regime Militar espelhou na educação o caráter anti-democrático de sua proposta ideológica de governo: professores foram presos e demitidos; universidades foram invadidas; estudantes foram presos, feridos e alguns foram mortos, nos confronto com a polícia, através dos aparelhos repressivos como o DOPS, o DOI-CODI; os estudantes foram calados, a UBES (União Brasileira de Estudantes Secundaristas) e a UNE (União Nacional dos Estudantes) proibidas de funcionar; o Decreto-Lei 477 calou a boca de alunos e professores; o Ministro da Justiça declarou que "estudantes tem que estudar" e "não podem fazer baderna". Esta era a prática do Regime. Diante da via pacifica adotada pelo PCB após o XX Congresso do PCUS e a busca de conciliação entre o bloco soviético e o bloco estadunidense após as denuncias de Krushev, muitos aderiram à luta armada nas organizações clandestinas como o PC do B (Partido Comunista do Brasil), ALN (Aliança Libertadora Nacional), VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), POLOP (Comando Revolucionário Marxista-Leninista de Política Operária), PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário).
Contraditoriamente, neste período deu-se a grande expansão das universidades no Brasil. E, para acabar com os "excedentes" (aqueles que tiravam notas suficientes, mas não conseguiam vaga para estudar), foi criado o vestibular classificatório. Para erradicar o analfabetismo foi criado o Movimento Brasileiro de Alfabetização - MOBRAL. Aproveitando-se, em sua didática, no expurgado Método Paulo Freire, o MOBRAL propunha erradicar o analfabetismo no Brasil... não conseguiu. E entre denúncias de corrupção... foi extinto.
É no período mais cruel da ditadura militar, onde qualquer expressão popular contrária aos interesses do governo era abafada, muitas vezes pela violência física, que é instituída a Lei 4.024, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1971. A característica mais marcante desta Lei era tentar dar a formação educacional um cunho profissionalizante. Dentro do espírito dos "slogans" propostos pelo governo, como "Brasil grande", "ame-o ou deixe-o", "milagre econômico", etc., planejava-se fazer com que a educação contribuísse, de forma decisiva, para o aumento da produção brasileira.
A ditadura militar se desfez por suas contradições: fim do famigerado milagre brasileiro; aumento da inflação e da dívida externa; arrocho salarial; reorganização do movimento operário com as greves do ABC paulista; a luta pela anistia ampla e geral; a revogação do AI-5 e o movimento diretas já!. Tamanha era a pressão popular, de vários setores da sociedade, que o processo de abertura política tornou-se inevitável. Mesmo assim, os militares deixaram o governo através de uma eleição indireta, mesmo que concorressem somente dois civis (Paulo Maluf-PDS e Tancredo Neves-PMDB).

No fim, a reação conseguiu o que quis, fez uma transição sem julgar os crimes cometidos pelo Estado e sucateando os setores essenciais ao povo e à classe operária do Brasil. O processo de terceirização de direitos e garantias começou com o aumento de alunos da classe média na escola privada, passou pelos planos de saúde, pela segurança privada (das grades, portões às empresas e ao “guarda do apito”). Constituiu-se um Estado burguês tributarista e concentrador de renda, corrupto na essência e alienante no seu aparelho ideológico, a mídia, na medida em que os próprios movimentos populares caíram no aparelhismo e na burocracia da democracia burguesa e institucional.